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Tirar passaporte torna-se fácil e ágil para pessoas com deficiência

Sinpa

Sistema on-line da Polícia Federal é adaptado para dar mais autonomia a pessoas cegas ou com dificuldades motoras
Exibir carrossel de imagens Todas as inclusões foram feitas levando em conta o eMAG – Modelo de Acessibilidade em Governo Eletrônico, que é, ao mesmo tempo, coerente com os padrões internacionais e customizado às necessidades brasileiras

Todas as inclusões foram feitas levando em conta o eMAG – Modelo de Acessibilidade em Governo Eletrônico, que é, ao mesmo tempo, coerente com os padrões internacionais e customizado às necessidades brasileiras

Vanessa Borges

Em julho de 2015, foi sancionado o Estatuto da Pessoa com Deficiência. Nele está o artigo 63, que cita que a acessibilidade em sites mantidos no Brasil, por empresas ou governo, é obrigatória e deve ser implementada conforme as melhores práticas e diretrizes adotadas internacionalmente. Atenta ao movimento crescente no país e no mundo de gerar um governo digital mais democrático, a Polícia Federal (PF) disponibiliza, desde 4 de dezembro de 2015, um ambiente virtual para solicitação do passaporte totalmente reconstruído a partir de recursos de acessibilidade.

“A nova versão do Sinpa, o Sistema Nacional de Passaporte, foi criada para tornar mais acessível a emissão do documento para todos os brasileiros. As mudanças contemplam principalmente as pessoas que possuem limitações visuais ou motoras, para que consigam usar o site corretamente, sem necessidade de ajuda de terceiros”, frisa o delegado Júner Caldeira, chefe da Divisão de Passaportes.

Com a reformulação, o site do Sinpa, ferramenta da PF para solicitação do documento, tornou-se compatível com softwares leitores de tela. Além disso, recebeu os recursos: otimização do contraste entre cor da fonte e cor do fundo, para melhorar a visualização; funcionalidade extra do “alto-contraste”, para quem tem dificuldade de ler com a cor de fundo clara; inclusão de links e teclas de atalho para acesso imediato a conteúdo, menu, topo e fim de página; menu prático, sem necessidade de retornar ao portal da Polícia para acessar outras opções do sistema, como reagendamento e consulta de solicitação; e adaptação para navegação via teclado, o que também é útil para pessoas com deficiência motora. Tais mudanças podem a princípio parecer imperceptíveis para parte da população. Mas elas representam a inclusão de fato, nesse serviço público, para os mais de 13 milhões de brasileiros que possuem deficiência motora, e para os mais de 35 milhões que têm alguma deficiência visual, segundo o IBGE. Esse é o caso de Everaldo Carniel  (abaixo), que é cego e testou a solução desenvolvida pelo Serpro para a PF, auxiliando na detecção de melhorias para o site, antes dele ser lançado.
Everaldo Carniel é especialista em acessibilidade virtual e ajudou a testar o novo site para solicitação do passaporte. Ele acredita que os recursos incluídos trazem independência para pessoas que têm dificuldades motoras, pouca visão, ou que, como ele, não enxergam. (Foto: Divulgação) “O resultado ficou muito bom. E participo de redes sociais e ouvi, de muitos colegas com deficiência, comentários positivos sobre o sistema”, conta Everaldo, que é professor gestor do Projeto de Acessibilidade Virtual no campus do Instituto Federal do Rio Grande do Sul (IFRS), em Bento Gonçalves. Everaldo acrescenta que ainda não tem passaporte, mas pretende tirar. “Viajo bastante dentro do Brasil, e quero fazer uma viagem internacional, futuramente. A gente fica bem mais tranquilo sabendo que, quando precisar, terá toda a facilidade para solicitar o passaporte. Para uma pessoa com deficiência é muito agradável conseguir fazer sozinho uma tarefa que antes não era possível”, destaca ele.

Além da equipe do IFRS, outros especialistas em acessibilidade – cegos e videntes – testaram a ferramenta antes de seu lançamento. Alice Gorini, da unidade de negócios que atende a PF no Serpro, complementa que os experimentos contaram com o apoio da Coordenação Estratégica de Ações Governamentais da empresa e da Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação (SLTI/Planejamento). Tudo para garantir o melhor resultado para o público-alvo das mudanças.

No gráfico 1, relativo à população brasileira: 23,9% possuem alguma deficiência; 76,1% não possuem. No gráfico 2, relativo aos tipos de deficiência (algumas pessoas declararam possuir mais de um tipo): visual - 35,7 milhões; motora - 13,2 milhões; auditiva - 9,7 milhões; mental: 2,6 milhões.

"Todos os cidadãos são iguais, têm direito a viajar, por exemplo. Nessa nova versão do Sinpa, atuamos para atender
às necessidades de pessoas com deficiência que precisam e devem, da mesma forma que os demais, utilizar esse serviço público”, frisa Alice. “Há o lema 'Nada para nós, sem nós'. É essencial que usuários reais façam testes e deem seus feedbacks para garantir que um produto, seja um site, uma cédula de real ou uma rampa, é acessível”, defende Everaldo, que já avaliou diversos sites do governo federal.

Construção coletiva

O passaporte é um dos produtos do governo federal mais conhecidos pelos brasileiros, e também internacionalmente. A PF e o Serpro acreditam que o acréscimo de recursos de acessibilidade no Sinpa simboliza não só a possibilidade de inclusão digital para quem tem deficiência visual ou motora que pode agora, com passaporte em mãos, alcançar outros horizontes, rumo a novos países. Para as duas instituições, o sistema também ajuda o país a "subir degraus" no que se refere à oferta, para o cidadão, de mais sites, sistemas e serviços de TI acessíveis. Pois vale lembrar que, segundo dados do consórcio de padronização da web W3C, somente 4,82% das páginas sob o “.gov.br” foram consideradas aderentes aos padrões de acessibilidade em 2011. Não há pesquisa mais recente do W3C sobre o tema, mas há uma série de legislações, diretrizes e discussões sobre acessibilidade virtual que mostram que, mesmo antes da pesquisa de 2011, o governo brasileiro, representado pelos seus diferentes órgãos, já vem modificando essa realidade em busca da inserção no e-gov de pessoas com diferentes tipos de deficiência que, de acordo com o IBGE, representam mais de 23% da população brasileira.

Para Márcio Brigidi, a nova versão do Sinpa, além de universalizar o acesso ao sistema, é um exemplo de uso da tecnologia, em prol da inclusão, que pode inspirar o surgimento de ações similares no governo “Muitas pessoas encontram dificuldades relacionadas à navegação e à usabilidade. Por isso, a metodologia do eMAG, que serviu de base para o Sinpa, orienta sobre que instrumentos podem ser adotados para facilitar a navegação e o acesso a portais da administração pública. Além de ir ao encontro do Estatuto da Pessoa com Deficiência, o atendimento a essas recomendações permite uma melhor prestação de serviço eletrônico a todos os cidadãos”, reforça o delegado Júner Caldeira. “No que concerne à TI, nós que trabalhamos no setor público, precisamos estar, de modo permanente, atentos às melhorias para os cidadãos, principalmente àqueles que tenham condições especiais, acrescentando funcionalidades aos sistemas para propiciar facilidades de uso e autonomia de acesso. A nova versão do Sinpa, por exemplo, permitiu a universalização do acesso a esse sistema, e é uma ação que pode desencadear outras do mesmo nível, pois bons exemplos tendem a ser seguidos, copiados”, acredita o superintendente de Negócios do Serpro que atende a PF, Márcio Brigidi (foto acima).

Curiosidades

Logomarca do leitor de tela NVDANão enxergar, parcial ou totalmente, não é empecilho para se usar um computador. Uma pessoa cega precisa, basicamente, de um leitor de tela, programa que converte em tempo real o texto escrito em voz. Há uma série de leitores – como NVDA e Orca, livres e gratuitos e opções para vários sistemas operacionais, inclusive para celulares e tablets.

Logomarca do sintetizador de voz Liane TTS, do Serpro Existem diferentes sintetizadores de voz – como o Liane TTS, um produto Serpro – que já vêm ou podem ser acoplados aos leitores. O usuário pode escolher timbre, entonação, velocidade da voz. Uma pessoa cega experiente no uso do computador, por exemplo, pode colocar uma voz muito veloz, o que, para quem não está acostumado, pode ser ininteligível.

Imagem ilustrativa da tecla da letra FO teclado de qualquer computador, com padrão brasileiro, possui saliências nas letras F e J e, por meio delas e só com tato, é possível localizar o restante das teclas. Por isso, com um pouco de prática, com os atalhos de teclado, uma pessoa cega é capaz de utilizar plenamente um PC.

Ícone representativo de uma pessoa cegaCom teclado e leitor de tela, é possível fazer tudo: formatar planilhas, escrever textos e e-mails, ler livros, navegar por sites e, claro, acessar serviços públicos on-line customizados com recursos de acessibilidade. Se ainda não conhece e quer ter uma ideia de como funciona, veja abaixo um vídeo demonstrando uma navegação via leitor (Orca com Liane TTS) pelo site de solicitação do passaporte.

Ícone representativo da leitura em BrailleCom o PC também é possível traduzir caracteres alfanuméricos para Braille. O conteúdo convertido pode ser lido na própria máquina ou impresso através de uma impressora especial. E há as impressoras 3D, que ainda são um artigo de luxo, mas podem imprimir cópias em alto-relevo de obras de arte famosas, como a Monalisa, para que se possa tocar nas imagens e imaginar como são. 

Símbolo sobre acessibilidade criado pela ONUHá soluções de TI para diferentes tipos de deficiência. Como plugins que traduzem o conteúdo de um site para Libras. Para as pessoas surdas isso é útil, pois muitas delas têm dificuldade de ler e escrever em português, já que o aprendizado da escrita é influenciado pela fonética. A implantação de diversas soluções, em sites do setor público, é recomendada pelo governo federal, via SLTI.

Sinpa é acessível: confira demonstração de uma navegação por pessoa cega, utilizando o Orca e o Liane TTS