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Governo digital e inovador
Governo digital
A evolução do governo digital é o caminho natural na era da democracia participativa
Ao longo dos anos, uma pessoa passa por diferentes estágios. Primeiro, é claro, tem seu nascimento, depois vem os estudos, o emprego. Essa pessoa pode ainda querer casar, ter filhos, mudar de cidade, viajar para o exterior, abrir um negócio. No percurso, talvez lide com um divórcio, uma doença, o furto de seu carro, a perda de entes queridos. Seja nas situações felizes ou nas difíceis, é preciso o suporte do governo para que se tenha, por exemplo, a documentação e o atendimento necessários para viver com cidadania. E já imaginou se, durante o ciclo de vida, existisse uma plataforma on-line com mais de 5.000 serviços públicos, juntos, para ajudar? Pois essa proposta é realidade na Coreia do Sul, um dos países que aparece em destaque na pesquisa sobre governo eletrônico publicada em 2014 pelas Nações Unidas.
"Temos visto uma evolução nos serviços de governo digital oferecidos por vários países. Fizemos um levantamento, a partir da pesquisa da ONU e uma da universidade japonesa de Waseda, e observamos boas práticas em cinco temas ligados a governo aberto, ou seja, que favorecem a transparência, a colaboração e a participação", ressalta Viviane Malheiros, da Coordenação Estratégica de Tecnologia, área do Serpro que prospecta tendências.
Além da Coreia do Sul, entre os países mais referenciados nos quesitos acima estão Japão, Austrália, Canadá, França, Estônia, Suécia, Nova Zelândia, Estados Unidos, Cingapura, Reino Unido, Holanda e Finlândia. Neles, estão presentes serviços e sistemas de TI que aplicam tendências que estão inovando a relação entre governo e sociedade: uma delas é a de criar uma autenticação digital única do cidadão, para propiciar o acesso a variados serviços a partir de uma porta de entrada. Outra vertente é a de unir dados dos cidadãos em uma só base, para que diversos atores sociais visualizem um mesmo conteúdo - registros sobre a saúde de uma pessoa, por exemplo, poderiam ser usados por ela mesma, hospitais, farmácias, e pelo governo na hora de planejar políticas. Há também a forte aposta em dados abertos, que facilitam o uso, reúso, distribuição e interpretação de informações pelo indivíduo e poder público. Existe a proposta da e-participação, que preconiza a atuação do cidadão na tomada de decisões que melhorem o bem-estar coletivo. E uma quinta prática é a já citada centralização de serviços em um único portal (imagem abaixo).
"O Brasil já possui serviços de e-gov, continua crescendo e há muita possibilidade de ampliação. No Serpro, nos inspiramos nos serviços ofertados pelo mundo para expandir as soluções do país"
Viviane Malheiros
"Trabalhar com a chamada transparência 2.0 e com a e-participação são duas grandes tendências da governança digital", reforça Cristiano Ferri, pesquisador em governança democrática e inovação associado à Universidade de Harvard. "E a ideia de uma central única de serviços é uma vertente muito clara, pois é uma forma do cidadão navegar, sem ter que saber qual é a competência de cada órgão do governo, e simplesmente encontrar o serviço que precisa", analisa Ferri, que é ainda idealizador do portal e-Democracia e coordenador do Laboratório Hacker da Câmara dos Deputados. "O Brasil já possui serviços de e-gov, continua crescendo e há muita possibilidade de ampliação. No Serpro, nos inspiramos nos serviços ofertados pelo mundo para expandir as soluções do país", complementa Viviane.
Para subir mais degraus
Dentro da proposta de centralizar serviços encontra-se o precursor Portal Brasil. "Nele, há o Guia de Serviços Públicos, que aponta as formas de atendimento, presencial ou eletrônico. Há o Guia de Aplicativos, que lista os apps disponíveis para download", lembra Jacimar Gomes, coordenador de negócios no Serpro, instituição que desenvolveu e hospeda o portal.
O brasil.gov.br já representa um avanço em e-gov, uma vez que centraliza links. Mas o governo federal acredita que pode evoluir muito mais, indo ao encontro da ideia de um grande portal unificado - com camadas incrementadas de serviços - e das outras tendências que estão sendo adotadas mundo afora. Para isso, investe no Bem Mais Simples, lançado em fevereiro para desburocratizar a máquina pública e simplificar o dia a dia de cidadãos e empresas.
"O programa tem cinco diretrizes. A de dar acesso aos serviços públicos em um só lugar, a de extinguir formalidades que se tornaram obsoletas com a tecnologia, a de guardar dados do cidadão para consultas em uma só plataforma, a de unificar o cadastro e a identificação do indivíduo, e a de resgatar a fé na palavra do brasileiro, substituindo documentos por declarações pessoais", destacou o secretário de Competitividade e Gestão da Secretaria da Micro e Pequena Empresa (SMPE) da Presidência da República, Carlos Leony, no Seminário Internacional Brasil 100% Digital, em abril. "Por que não poderíamos ser reconhecidos por alguma autenticação digital, seja por um mecanismo mais avançado ou uma simples senha? Por que preciso levar um monte de documentos para provar que sou eu mesmo, se a tecnologia já permite compartilhar informações?", acrescentou Leony, no seminário intitulado como primeira iniciativa para redação da Agenda para o Brasil Digital, que reunirá orientações para que o país se torne uma nação avançada no uso de tecnologias digitais.
A Presidência prevê que a base integrada do cidadão - com dados biográficos e biométricos, o registro civil nacional e as demais diretrizes poderão ser concretizadas com apoio de diferentes entes. Entre eles, está o Serpro. "Temos auxiliado a SMPE na concepção dessa base. E todo o conceito de e-gov está sendo repensado, já que se buscam integração total dos governos e apresentação dos serviços ao cidadão em um local único e 100% on-line", enfatiza Bruno Vilela, da unidade que atende a Secretaria.
Há ainda parceiros como cartórios, Dataprev e Justiça Eleitoral, a qual administra o maior cadastro de cidadãos de toda América Latina - são mais de 143 milhões de eleitores, sendo 24 milhões já identificados biometricamente.
Sem muros
Outro investimento nacional são as ferramentas que permitem que pessoas colaborem entre si, e com o governo, para cuidar de algo de interesse público. São iniciativas produzidas em diversos formatos, mas todas com a mesma proposta de participação digital reconhecida na pesquisa de 2014 da ONU: há um indicador sobre e-participação no qual o país assumiu o 24° lugar, tendo evoluído sete posições desde 2012. "Temos canais como o Participa.br, o e-Democracia, o e-Cidadania. Há o Ministério da Justiça, que faz consultas on-line, e alguns Estados e municípios que começam a fazer. Temos que continuar investindo nisso que realizamos de bom, para consolidar essa cultura de participação digital", acredita o pesquisador Cristiano Ferri.
O futuro do e-gov
Também no documento da ONU, o Brasil aparece na segunda melhor categoria de classificação, no índice geral sobre e-gov, e ocupa a 57ª posição, em um ranking com 193 países. Segundo a ONG Open Knowledge, o país é mais transparente que Estados Unidos e Alemanha no que se refere à abertura de dados sobre gastos federais. E no índice geral de dados abertos, da mesma ONG, está no 26° lugar, entre 97 nações. Já no ranking de e-gov, com 61 países, feito pela Universidade de Waseda, encontra-se na 40ª colocação. Cada um dos estudos, é claro, tem metodologia e recorte diferentes, mas seja como for mostram que o país está no caminho e pode se aprimorar rumo a um governo cada vez mais digital, moderno e participativo.
"O Brasil é continental. A oferta de serviços on-line pode ser mais abrangente, a partir de mais acesso à internet, o que até hoje é uma dificuldade em vários lugares do país. E está bem posicionado em transparência, mas há muita oportunidade para aperfeiçoar os níveis desse quesito e permitir que a população consuma melhor as informações", exemplifica Viviane, que atua ainda no Centro de Informações Serpro, inaugurado neste ano para ajudar a empresa a trazer formas inovadoras de tratar e disponibilizar dados para governo, empresas e cidadãos. "Esses índices têm falhas em computar alguns elementos. De qualquer maneira, modernizar o Estado é algo que pode ser mais forte na agenda do governo. Temos que investir na inovação, nos agentes públicos e na interação com cidadãos, como os especialistas, os hackers e a geração de nativos digitais que já possui a cultura da abertura e do compartilhamento, o que contamina positivamente a burocracia. Estamos evoluindo, mas podemos avançar bastante", completa Ferri.